Drica Guzzi

Drica Guzzi é engenheira, professora e palestrante da área de cultura digital e novas tecnologias de informação e comunicação, com ênfase em educação e aprendizagem on-line e pesquisa em teoria de redes, inclusão digital e internet. É mestra e doutora em comunicação e semiótica e gestora de políticas públicas. É coordenadora de projetos e pesquisas na Escola do Futuro da USP, onde coordena o Acessa SP desde 2000. Entre outros inúmeros projetos de inclusão digital, é criadora e geradora de conteúdos para o Portal da Juventude, do Governo do Estado de São Paulo. Autora do livro Web e Participaçãoa democracia no século XXI, Drica tem vários artigos e entrevistas disponibilizados em livros, revistas científicas, sites e blogs.  Como toda boa canceriana, Drica é mãe e nas horas vagas adora cozinhar e ter os amigos em volta de uma boa e calorosa mesa.


 

VOC – Oi, Drica, é uma enorme alegria e honra tê-la aqui conosco.

Drica  – Obrigada Ciça.  É um prazer muito grande estar aqui e poder compartilhar com vocês um pouco da minha experiência profissional e pessoal.

VOC – Pra começar, conte-nos o que você faz atualmente.

Drica: Sou Coordenadora de Projetos e Pesquisas na área de novas tecnologias de Informação e Comunicação, voltadas para a educação e o desenvolvimento da cidadania, na Escola do Futuro da USP. Além disso, participo de vários movimentos de educação e midiativismo relacionados com o Open Access ou  Livre Acesso ao conhecimento. Dou aulas de Teoria de Redes e estou escrevendo meu segundo livro, que deve ser lançado ainda neste ano, cujo nome provisório é: “O Cuidado de Si e o Mundo Distribuido –  praticas políticas em Rede”.

DRICA GUZZI 1VOC – E qual é a sua 1ª formação e onde?

Drica – Sou formada em Engenharia de Alimentos, pela Unicamp, mas minha atuação nesse campo foi curta.

VOC – E como você escolheu esse curso? Foi fácil? Você pensou em fazer outra coisa ou tomar outra direção naquele momento?

Drica – Eu me interessava, assim como me interesso ainda, por muitas coisas. Sou filha de mãe psicanalista e pai economista. Tive avós empreendedores na área agrícola e na industrial. Como eu não tinha nenhuma aptidão muito destacada – ao contrário, navegava bem tanto nas exatas, matemática e fisica, quanto nas áreas biologicas, em ciências e nas humanidades – resolvi então fazer Engenharia de Alimentos pois era um curso relativamente novo no Brasil, integrava diferentes áreas do conhecimento e me parecia uma profissão do “futuro”, mais inventiva e ainda com muita coisa a ser feita. Na época, conversava bastante com meu padrinho, que me incentivou bastante a fazer o curso. Ele sempre me dizia que engenharia se encaixava em muitos lugares e que eu não me preocupasse muito com onde eu iria trabalhar no futuro.

VOC – E como você começou sua vida profissional e onde já trabalhou?

Drica – O último ano da maioria dos cursos universitários é bastante voltado para o mercado de trabalho, programas de trainées, estágios, etc. A grande maioria de meus colegas estava imersa em palestras de empresas, inscrições em dinâmicas e processos seletivos. Eu estava querendo continuar os estudos em alguma área mais generalista, pois já havia percebido que não seguiria em frente com a engenharia propriamente dita. Tinha decidido ir pra Boston fazer um curso de especialização, mas resolvi preencher a ficha de inscrição do processo de trainées da Unilever (na época Gessy Lever). Acabei passando por todas as etapas e fui selecionada como trainée. Fiquei no Brasil e comecei na área de Supply Chain (na época nem sabia o que significava isso!)

Trabalhei primeiro em Marketing, depois Supply Chain (Gerenciamento da Cadeia de Suprimentos). Meus múltiplos interesses persistiam e, em paralelo, eu estudava muito filosofia, comportamento humano e a área de treinamento e desenho organizacional começou a me atrair. Mudei para a área de Recursos Humanos. Como gerente de RH cuidei da fabrica de Vinhedo, com mais de 1.000 funcionários (e eu tinha apenas 27 anos!). Abrimos uma fábrica em Curado, no Recife, e lá desenvolvemos inúmeros programas educacionais, experimentamos novos modelos de trabalho, grupos de melhoria, foi uma época bastante interessante. Trabalhávamos muito com a ideia de “faça da sua vida uma obra de arte”, ou seja, sermos responsáveis por nossas escolhas e diminuir o discurso vitimizado e refém de um contexto, principalmente dentro de uma coorporação. Fui responsável pelo processo de Trainées 2.000, que trouxe uma inovação no processo seletivo, pois a primeira fase foi toda pela Internet e quando terminou o projeto, achei que tinha fechado um ciclo. Fui responsável pelo mesmo processo que me levou à Unilever e já estava na hora de abrir o caminho. Naquela época, estava também bastante interessada nas novas tecnologias, na rede de comunicação que estava crescendo no Brasil, a internet. Tirei um ano sabático, fui para NovaYork. Lá me envolvi e passei a estudar filmes independentes, e-commerce e entrei no projeto com Pierre Lévy: Collective Inteligence.

VOC – E foi aí que se deu a enorme virada profissional em sua vida?

Em 2001, ao voltar de Nova York, comecei a trabalhar com as novas tecnologias de informação e comunicação. Procurei quem estava falando e trabalhando com isso e encontrei a Escola do Futuro da USP.  Na realidade, há 14 anos, quando iniciei minhas atividades na Escola do Futuro, eu sabia que queria trabalhar com o que as novas tecnologias poderiam proporcionar para a educação e o desenvolvimento social e comunitário, partindo do princípio de que a grande maioria da população não tinha acesso – mas deveria  ter – às ferramentas e benefícios que a internet, que começava a nascer, poderia oferecer. Praticamente ninguém conhecia o termo “inclusão digital”. Naquela época, lá fora havia a expressão “digital divide” que, em suma, se referia a uma brecha ou divisão entre os que tinham e os que não tinham acesso a um computador.

DRICA GUZZI 8A enorme virada se deu quando tive o insight, em 2.000 que o mundo não seria o mesmo depois da Internet e da conexão em rede entre as pessoas. E eu tive a clareza que queria participar deste mundo em produção. Eu sabia que a tecnologia, se não fizéssemos nada, iria aumentar as desigualdades sociais ao invés de diminuir; e ficou claro pra mim que eu gostaria de investir meu tempo trabalhando nisso. Eu tive o insight, acreditei nele e fui em frente.

VOC – E agora, tente nos dar uma ideia de tudo o que você faz, onde trabalha, que projetos coordena etc.

Drica: Dentre os trabalhos que desenvolvo com a equipe da Coordenação de Projetos e Pesquisas na Escola do Futuro, encontram-se as pesquisas e ações junto ao Programa de Inclusão Digital Acessa SP e o Juventude SP, ambos vinculados ao Governo do Estado de São Paulo.  A ideia central que norteia nossas atividades é fazer com que a população em geral se aproprie das ferramentas de comunicação e informação, como um mecanismo  para sua efetiva participação na sociedade em rede e nas políticas públicas que a ela se destina.

Em termos de pesquisa, buscamos estar sempre em sintonia com as tendências e práticas na área da inovação tecnológica de uma rede que pensa, dentro e fora da Internet, as novas possibilidades de interação através do compartilhamento de conhecimento e experiências, sobretudo em relação a uma educação que não se limite apenas  ao aprendizado tradicional das escolas, mas que reflita numa melhoria de vida da sociedade de uma maneira mais ampla.

Antes da Internet, essa prática parecia coisa de especialistas, de técnicos do governo e  cientistas sociais. A comunicação governo-sociedade, alunos e professores, a transparência dos dados do governo, bem como do conhecimento científico, era muito restrita. De certo modo, a população tinha acesso às informações pela mídia ou propaganda oficial. Hoje, com as possibilidades criadas pela internet para a ampliação das discussões, publicações de fotos e vídeos, ou seja, há um novo comportamento gerado pelas redes sociais. Por exemplo, as discussões de praticamente tudo o que se relaciona com o dia a dia das pessoas se ampliam e se distribuem de uma forma mais direta.  Esse é um dos motivos pelos quais dizemos que somos pesquisadores e midiativistas da cultura digital, atuando dentro e fora das redes.  Ainda no âmbito do ativismo digital nacional, sou membro-fundadora do blog lixoeletronico.org, integro a Câmara de Universalização e Inclusão Digital do CGI-br,  participo como especialista em análise de pesquisas TIC Domicílio e Kids Online do Cetic.br, integro o GT de jornalismo de dados do W3C, sou conselheira do Comitê de Qualidade da Associação Brasileira de Educação a Distância (ABED) e do Instituto Educadigital.

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VOC – Você imaginava que chegaria a ocupar espaços tão importantes e criar oportunidades tão preciosas para os jovens e carentes de educação de qualidade?

Drica  – Não imaginava e nem fazia qualquer plano para isso.

VOC – E como é o seu dia a dia, como se divide entre essas diversas atividades?

Drica – Meu dia a dia é bastante corrido, mas confesso que gosto. Eu me “distribuo” entre as atividades com a Nina, minha filha, os projetos na Escola do Futuro, reuniões, práticas de si (o zen budismo, retiros, meditacão, massagem, terapia, grupos de estudo), pesquisas, viagens, amigos e família. Aquele ditado Zen descreve perfeitamente o que acontece comigo; diz algo do tipo: “Deixo para os outros definirem se aprendo, trabalho ou me divirto. Faço os três juntos e para mim é impossível separá-los”.

VOC – Fale-nos um pouco sobre seus livros e trabalhos já publicados…

DRICA GUZZI 6Drica – Em 2010, foi lançado o meu livro Web e Participação – a democracia no século XXI (Editora Senac, 3º lugar do Prêmio Jabuti), com base nas pesquisas que já vinha desenvolvendo sobre participação pública e que foi o tema de minha dissertação de mestrado em Comunicação e Semiótica. Atualmente estou escrevendo o meu segundo livro, que deverá ser publicado neste ano, a partir de minhas pesquisas sobre a apropriação dos meios de comunicação e as novas práticas políticas em rede. Escrevo regularmente artigos para livros do Centro de Estudos sobre as Tecnologias de Informação e Comunicação (CETIC.br) do Comitê Gestor da Internet, do qual participo como especialista em mediação no uso das TICs e tenho alguns capítulos em livros e artigos publicados em revistas científicas.Atualmente estou atualizando meu blog dricaguzzi.info, onde pretendo deixar disponibilizado todos os meus artigos e entrevistas.

VOC – Quais são as suas atividades de lazer preferidas?

Drica – Gosto muito de ler, assistir a filmes, ir a shows, viajar (vou bastante para a praia), cozinhar, estar com a família e os amigos; e principalmente, sempre que possível, compartilhar esses momentos com minha filha Nina, que agora está com 9 anos. Pratico meditação e adoro um bom vinho.

DRICA GUZZI 9VOC – Quais são seus projetos futuros?

Drica – Continuar os projetos e pesquisas na área de Educação e Comunicação, ampliar minha atuação nas políticas públicas e estratégias de intervenção e engajamento social. Nesse ano pretendo, além das atividades de coordenação do Lab EF,  publicar meu segundo livro, lançar o blog Política do Futuro e participar do projeto Cidade Azul, além de continuar com minhas praticas meditativas e quem sabe namorar um pouco, pois afinal, merecemos.

VOC – Que conselhos você daria para aqueles jovens que desejam como você trabalhar pela melhoria da educação e da cultura neste país?

Drica – O conselho é acreditar que dá pra mudar, confiar nessa percepção e desejo e ir atrás de pessoas, projetos que alimentem essa mesma crença. Acreditar mesmo quando todos à sua volta não acreditam ou não compartilham com você das mesmas crenças. Aprimorar-se, precisa esforço. Esforço com alegria, mas é preciso esforço, estudo, resiliência. Procurar conhecer a si mesmo para poder escolher o melhor para si, as zonas de harmonia entre exigências e capacidade. Treinar a capacidade de atenção/concentração de si e do contexto à sua volta. Y adelante pois la lucha continua.

VOC – Drica, muito obrigada por dividir conosco sua preciosa trajetória.

Drica: Obrigada a vocês! E para quem quiser conversar mais ou compartilhar algo pode me escrever no: drica.guzzi@gmail.com

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